Debaixo dos litros de água quente que se despejavam do chuveiro elétrico, Cléber tentava, em vão, livrar-se daquela sensação desagradável. Desde sempre era tido por todos seus amigos e conhecidos e familiares como um exemplo de marido fiel e respeitoso. Ele mesmo sentia-se assim. Casara-se ainda quando jovem com sua alma gêmea, sua metade da laranja. Eram felizes e um casal exemplar. Jamais pensara em cometer qualquer ato que pudesse, ainda que remotamente, ser considerado uma traição. Mas tudo isso mudara. Ali, embaixo do chuveiro, Cléber revivia cada segundo daquela tarde quente. E a cada memória, sentia-se sujo, imundo, adúltero.
Ainda lutava para compreender como tudo acontecera. Foi tudo muito rápido. Cléber estava dirigindo seu carro, um confortável e elegante sedan nacional, quando viu na calçada, em frente ao banco, uma garota irresistivelmente linda. Caminhava a passos decididos, firmes, com um rebolado que Cléber pensara não existir nesse mundo. Os cabelos volumosos e negros contrastavam contra pele alva e lisa, imaculadamente perfeita. O vestido curto de verão, simples porém sensual, exibia pernas e ombros. Encimada em sapatos de salto alto, Cléber não conseguiu desviar o olhar. O mais impressionante é que nunca sentira-se atraído por mulheres mais jovens. Mas aquela ninfeta era impossível de resistir.
Sem saber de onde veio o impulso, parou o carro ao lado da moça. Ele a admirara apenas de costas, mas mesmo assim estava decidido: precisa tomar uma atitude. Que atitude? Cléber jamais fora o tipo conquistador. Seu casamento mesmo não foi iniciativa sua, precisou ser conquistado, galanteado. Cléber, no fundo de sua mente, percebia o ridículo da situação. Não sabia sequer o que dizer a uma garota.