Sempre preferi as morenas. Não sei porque, mas há algo de sensual na forma como refutam a futilidade loira. Gosto de louras também, mas as morenas dominam meu horizonte. É assim, não adianta. Cada um tem suas taras e predileções. Para Ricardo, por exemplo, pouco importa se é alta ou baixa, loura ou morena. Tem que ser gostosa. O Cenoura não admite, mas todos sabem que ele é fissurado em japinhas (ia dizer “asiáticas”, mas aí iria soar tão falso...). O Rafão, por outro lado é seguidor da filosofia do síndico Tim Maia: a mulher ideal é aquela que não tem pau...
Para essas e todas as outras preferências, existia o lugar ideal. O Ponto Rock. A melhor danceteria/discoteca/casa noturna/boate/ou seja lá qual for a porra de nomenclatura atual que já existiu na praia, quiçá no mundo. O oásis para onde iam todas – eu disse todas – as gostosas do litoral.
Aquele era um lugar mágico. Era, porque nada que é bom dura para sempre. Nos fins de semana, quando suas portas abriam-se, o céu de verão era sempre estrelado e a lua sempre cheia. Construído à beira de um lago, não possuía paredes, de forma que a brisa marinha constantemente fazia arrepiar as deliciosas gurias suadas na pista de dança. Os bares, estrategicamente posicionados ao redor da pista central, derramavam litros e litros de álcool sobre os frequentadores, tudo com o único e flagrante objetivo de permitir a pegação ao som do melhor rock´n´roll.
Como dito, mágico.
Mas a verdadeira mágica acontecia com a mulherada. Era impressionante. Deslumbrantes, chegavam em quantidades impossíveis. Nosso grupo, ainda jovem, literalmente babava olhando-as dançar. Ainda lembro de uma determinada noite, lua cheia como todas as outras. Não era carnaval ainda, mas quase. Naquela noite, um grupo de amigas resolveu dançar exatamente na frente do bar em que bebíamos. Lindas, exuberantes, voluptuosas. Pense em qualquer um adjetivo desses exagerados para definir mulheres maravilhosas. Todas usavam aquelas sainhas curtas, com as coxas bronseadas de fora e com um vesinho do lado. Sabe? Aquelas saias com um “V” do ladinho, mostrando um pouquinho mais de corpo? Era como se estivessem uniformizadas. As barriguinhas, todas de fora, brilhavam na medida em que as luzes da pista de dança refletiam no suor.
Elas estavam ali, ao alcance do braço. Podíamos sentir os perfumes cítricos e doces que usavam. Mas eram apenas quatro. E nós estávamos em cinco. Grupo completo. Julinho, vendo que a matemática não batia, deu um último gole na cerveja long neck mexicana, cuspiu o limão que a bartender insistia em colocar no gargalo e, sorrindo, afastou-se de nós. Sumiu em meio à multidão de quase três mil pessoas – duas mil de mulheres, por certo.
Pronto. Eramos quatro rapazes – bom, três rapazes e um tarado – e elas eram quatro beldades. Mas no meio delas, uma se destacava. Eram todas bonitas, sensuais. Duas eram morenas, e juro por Deus que até hoje não sei dizer qual delas era a mais bonita. Uma era loira, mais baixa que as suas amigas, mas com a pele dourada do sol e fartos seios – que depois me disseram ser silicone. Compensava a falta de altura com sapatos de salto altíssimo, perfeitos para deixar suas coxas grossas bem torneadas. Mas quem se destacava mesmo era a quarta integrante do grupo. Alta, com quase um metro e oitenta, hipnotizava a todos em volta. Seus cabelos cacheados pendiam suavemente e emolduravam os olhos negros como a noite. Seus lábios, fartos e vermelhos, punham as almas dos homens em chamas de tanta luxúria. Mas seu corpo, ah, seu corpo, era decididamente escultural. Tudo perfeitamente em harmonia com o tom achocolatado de sua pele. Pois ela era negra.
Em meio à maioria de pele branca, uma mulher negra, que parecia ter sido concebida para desfilar no carnaval carioca, era uma visão inebriante.
Tentei confabular com os guris quem chegaria em quem. É o que nós, homens fazemos. Porém, foi apenas eu me virar que o Cenoura saiu, como um louco, a dançar com as gurias. Pior: a dançar COMO as gurias. Mãos pra cima, coreografias cretinas e passinhos laterais. Ridículo? Óbvio que sim. Mas deu certo. Em questão de segundos elas sorriam para que o Ricardo, o Rafão e eu nos juntassemos a elas na pista de dança. Aquela foi a primeira vez que as dancinhas do Cenoura funcionaram...
Acontece que a noite ainda nos reservaria uma grande surpresa. Maior até mesmo que o toco dado por uma das morenas no Ricardo. Antes mesmo do fim da primeira música depois que nos juntamos às gurias, o Rafão surpreendeu e, na base do pescoçasso, se grudou aos beijos com a beldade de ébano. O Rafão! Se eu não estivesse vendo com meus próprios olhos, diria que não era verdade.
A noite passou e, aos poucos, o negro do céu foi cedendo espaço para as primeiras luzes da manhã. E nós curtindo as gurias no Ponto Rock. E o Rafão grudado aos beijos na Globeleza. Aposto dez reais como ele sequer desgrudou pra perguntar o nome dela...
Fim de festa, as gurias foram embora. Todas juntas, para nosso azar. (Dividir para conquistar, essa era a meta). Sentados no bar dos fundos, junto às mesas de sinuca, bebiamos água mineral com gás. A cerveja àquela altura da manhã parecia fel. E olhávamos todos para o heróis da noite. Rafão estampava um sorriso genuinamente feliz. Mais faceiro que pinto no lixo.
- Cara, que negra maravilhosa tu pegou!, disse o Cenoura.
- Que inveja, nunca fiquei com uma negra ou mulata. Ou mesmo uma branca gostosa como essa. Tá de parabéns, Rafão!, confessou Ricardo enquanto eu me limitava a bater palmas, sem palavras.
E então Rafão nos calou. Sua simplicidade de pensar, de ser e de agir, que tantas vezes riamos impiedosamente, dessa vez nos humilhou. Uma verdadeira lição.
- Ela era negra? Nem percebi. Só vi que ela era legal, sem julgamento ou preconceito nos olhos.
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Pedrão quer ser o David Coimbra! heehhehe
ResponderExcluirTa legal alemão!
Nessa eu admito: foi fonte de influência.
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