Muito importante para todos os que lerem as postagens: por vezes estarei falando sério, postando opiniões próprias. Outras vezes estarei brincando com opiniões que poderiam ser minhas, mas não são. E por vezes postarei material totalmente fictício, frutos da imaginação e talvez um pouco influenciados pelas experiências acumuladas ao longo dos anos.
Distinguir o que é realidade e o que é ficção fica a cargo de cada um.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Pais, Filhos, Barbas e Futebol

Os momentos entre pai e filho são marcantes. Isso porque, diferentemente da relação entre a mãe e sua prole, o pai moderno volta ao trabalho apenas 3 dias depois do nascimento. O contato com o filho fica restrito, portanto, ao início da manhã e à noite. O coração, a cada despedia, dói. Dói demais... Pela manhã a criança pede pela mãe, para mamar. À noite, dorme. Sobra então trocar as fraldas na madrugada, mas aí a trabalhar no dia seguinte...

Foi pensando nesses poucos momentos para curtir o meu filho que cheguei em casa. Eram quase oito horas da noite. Para os antigos, hora da janta e da novela. Para mim, hora de pegar meu guri no colo. Cheguei desesperado por um banho e uma muda limpa de roupa, afinal passara o dia na rua e estava sujo. Longe de mim emporcalhar ou contaminar com algum germe o piá. E, após um beijo na testa, me fui para o chuveiro.

De roupa limpa (OK, pijama), fui tomado por uma estranha compulsão. Eu tinha que fazer a barba. Simplesmente precisava. Foi como se estivesse a ouvir meu pai contar aquela mesma história pela nonagésima vez.


Cresci ouvindo meu pai contar como ele era obrigado a se barbear toda a noite quando chegava em casa. Quando pequeno, meu pai usava um farto bigode, mas nada de barba. Após um dia inteiro fora, trabalhando – exatamente como eu agora – ele chegava cheio de carinho, procurando pelo filho – de novo, exatamente como eu agora! Ainda hoje quando ele conta a história (e ele a conta ao menos uma vez por mês) é possível perceber a emoção na sua voz. Conta meu velho pai que, após o longo dia de trabalho, sua barba já estava pontuda novamente, mesmo tendo-a feito pela manhã. Quando me pegava no colo e vinha para me beijar, diz ele que eu, com as duas mãos, o afastava, pois a barba estaria a arranhar o rosto de bebê.

A solução encontrada, de início, era barbear-se uma segunda vez ao dia, ao chegar em casa. De rosto liso, beijar o filho e pegá-lo (ou melhor, pegar-me) no colo era garantia de momentos de encher o coração. Mas essa felicidade cobrava um preço alto. Assim como a pele sensível do bebê, meu pai reclamava da pele judiada por tantas barbeadas. Sobrou-lhe então uma única alternativa: deixar a barba crescer até ficar macia.

Nunca imaginei que o mais característico traço de meu pai – sua cheia, imponente e robusta barba, a qual usou por anos a fio e sem a qual custei a reconhecê-lo – fosse na verdade um sacrifício de amor.

Pensando nisso, peguei mina gilete e de pronto afeitei-me. Estranho como fui possuído pela voz de meu pai. Na verdade, fui dominado por um medo, bobo é verdade, de que meu próprio filho pudesse me repelir. São tão poucos os nossos momentos juntos – como esse, no qual eu escrevo e ele dorme – que a ideia de não poder pegá-lo no colo e beijar-lhe a face me transtornou.

O mais curioso disso tudo é como algumas experiências entre pai e filho se repetem. Justamente por serem exíguas – e por mais abundantes que sejam, parecem nunca serem suficientes – percebe-se nitidamente um padrão de repetição nessas experiências. Verdadeiros clichês.

Como jogar futebol. Todo pai anseia por jogar futebol com seu filho. Assim como meu pai fazia a barba toda noite, eu também tenho feito. Do mesmo modo como estou ansioso para jogar bola com meu filho, eu joguei bola com meu pai.

O jogar bola entre pai e filho é algo mágico. Mais até que trocar fraldas na madrugada ou verificar a respiração enquanto o pequeno dorme do carrinho de passeio ao meu lado. É um momento único que não pode ser substituído, Não há mãe, tio, avô. Só nós dois. Pai e filho, filho e pai. É ali, entre um chute e outro, que se descobre alguns pequenos segredos, desses que marcam a amizade entre pai e filho. É ali que se tem a oportunidade de ser herói e conquistar o orgulho do outro. Seja pai, seja filho.

Da mesma forma como lembro de meu pai toda noite ao passar a navalha na pele do rosto, penso nele também em nosso primeiro jogo de futebol. E cada vez que penso na primeira vez que joguei bola com meu pai, fico ansioso para levar o meu próprio filho para um campinho. Incrível como os anos passam e aquele momento continua gravado na minha memória. Em verdade, não há nada de incrível: momentos pai-e-filho são mágicos e, portanto, ficam marcados não na memória, mas no coração.

Era natal. Como de praxe, estávamos todos em Carazinho, na casa de meu avô, pai da minha mãe. Meu pai não estava junto. Por serem meus pais separados, tais momentos pai-e-filho tornaram-se, desde cedo, ainda mais raros. Mas era natal. E naquele natal meu pai foi me buscar para almoçarmos. Era dia 26 de dezembro e fomos até Passo Fundo, a apenas quarenta quilômetros de distância, almoçar na casa de meu padrinho.

Lembro como se fosse hoje. Depois do almoço, chovia. Uma chuva de verão. O calor persistia por entre a umidade. Nos fundos da casa do dindo havia um campinho, pequeno mas suficiente para jogar futebol. Fomos cada um para uma goleira. Gol a golexperimentando aquele sentimento novo, de ter um pai presente, que me ama, que me ensina, que se orgulha. Foi ali que descobri que meu pai jogava de atacante. Foi lá que contei pra ele que eu jogava de zagueiro. Paramos apenas quando o sol se pôs. Suados, extenuados. Felizes.

É exatamente este o sentimento que quero. Fazer meu filho feliz. Que ele seja tão feliz comigo como fui com meu pai aquele dia. Quando olho para meu filho, mal posso esperar por este dia. Pelo dia perfeito. Apenas ele e eu, filho e pai. Espero fazer tudo certo, para que ele possa se lembrar por toda a sua vida o quanto eu o amo.

Cada vez que me barbeio, sinto que mal posso esperar para jogar bola com meu filho pela primeira vez. Porque para jogar com meu pai, eu esperei vinte e dois anos.

5 comentários:

  1. Tô feliz por ti, Pedrão!!! Mas feliz MESMO!!!

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  2. Pedrão,

    Lendo teu texto, ratifico minha opinião que "os filhos pertencem aos pais".

    Isto mesmo, mulher foi feito para tirar cria, mas os filhos, efetivamente são dos PAPAIS.

    Nós, pobres exemplares do último resquício da heterossualidade gaúcha temos todo o direito de afirmar isso.

    Afinal, só nós sabemos como é gratificante receber aquele abraço do único ser no mundo que nos ama incondicionalmente:

    - O FILHO!

    Pois todos os outros amores de nossa vida são, para o espanto de muitos, condicionais.

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  3. Pedrão, me emocionei com as suas palavras, realmente é mto profunda esta relação entre Pai e filho. Tenho verdadeira veneração pelo meu "velho" e ele será eternamente o meu herói.
    Parabéns por esse momento "paizão" que estás vivendo.
    Grande Abraço!

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  4. Valeu todo mundo pelo carinho.
    Bjs e abraços.

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  5. Pedrão....
    Ainda não conheci o pequeno Henrique.... o mais novo membro da Familia Kraemer, mas não deixo de acompanhar tdos os comentários, tdas as fotos e postagens que fazem dele.
    Estamos loucos pra conhecer o novo primo, eu e a Karen.
    Assim que baixar um pouco a poeira, vamos fazer uma visita.
    Esta postagem acima é exatamente o que um pai almeja de seu pequeno guri, o amor, a compaixão, o carinho, tudo, mesmo que seja em pequenos momentos. Pelo menos neste momento, daqui a pouco verás que o tempo não será tão importante assim, mas sim os momentos que passarão junntos. Juntos dos amigos, da família, da tua peuqena familia (esposa e filho), verás que os momentos presentes não serão esquecidos nunca, estarão sempre gravados na memória da vida. E nós como bons amigos, além de primos, queremos estar ao seu lado em tdos estes momentos mágicos. Saibas que podem contar com a gente sempre, pra tudo, qq coisa. É só ligar e avisar.
    Beijo grande aos 3, amamos vcs!
    Beijão

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