Eu já havia tido experiências anteriores, levado por meu pai. Mas
por ser muito novo, lembro apenas de fragmentos. E as memórias são
confusas. Não lembro de muito, apenas de algumas emoções. Evidente
que meu, orgulhoso de si, gosta de contar-me as histórias. Mas as
memórias, na realidade, são dele, não minhas. Por isso, minha
primeira vez, mesmo, oficial, considero aquela da qual tenho memórias
completas, na qual pude de fato participar.
Era verão. Dia de calor, como é comum em Porto Alegre. Eu era guri,
e quem me levou foi meu padrinho. Junto, estavam os dois filhos guris
e o sobrinho dele. Nós quatro tínhamos aproximadamente a mesma
idade, o que fazia de nós quatro excitados neófitos.
Saímos cedo, logo depois do almoço. Não faço ideia do quanto meu
padrinho gastou. Apenas sei que ele pagou por tudo. Passeio no museu,
presentinho na loja oficial, ingressos, refrigerantes...
Era minha primeira vez assistindo o Grêmio no Olímpico.
Lembro-me até hoje da partida. Grêmio 3 x 0 Glória de Vacaria. Era
Gauchão, e para ser honesto, não lembro o ano. Mas foi em um dos
hexas conquistados na década de 80...
O estádio não estava lotado. Por isso, cada vez que a transmissão
das rádios AM apitavam aquele som característico em que o narrador
informa o tempo de partida, ouvia-se o eco pelas cadeiras, de onde
assistíamos a partida. Durante muitos anos, eu achava que aquele
apito era do próprio estádio, e que as rádios o captavam pelos
microfones, e por isso eu o ouvia em casa. Mas, como eu disse, eu era
muito novo, e ainda não sabia das coisas.
Aquele foi o primeiro de muitos jogos no Monumental. Houveram muitos,
muitos, muitos outros. Todos especiais. Todos simbólicos. Até mesmo
os mais insignificantes.
Durante a década de noventa, meu pai me levava ao estádio apenas em
jogos internacionais. Era uma fixação dele. Jogos contra os
argentinos do Racing e Independiente, uruguaios como Peñarol, eram
os favoritos dele. Nos outros jogos eu tinha de ir com os amigos –
e os pais deles – pois minha mãe não me deixava ir sozinho. Não
enquanto eu ainda era criança. Jogos em dia de semana, a noite,
tinha de ser com algum adulto. Como meu pai e minha mãe já eram
separados, e eu via o velho apenas uma vez por semana, o dia que ele
me pegava em casa para passear era, justamente, os dias de jogo no
Olímpico. Aquele era o nosso vínculo, nosso tempo junto.
São muitas memórias. A maioria boas, felizes, emocionantes.
Orgulho-me de dizer que eu estava lá, nas arquibancadas, naquela
histórica final em 1995. De novo o Grêmio marcou três gols, dessa
vez contra o Nacional de Medellin. Aquela foi apenas a mais
proeminente partida que acompanhei do mais sensacional time do Grêmio
que pude acompanhar em minha vida. Nasci em 1981, então era muito
pequeno para apreciar o time de 1983. Mas o de 1995, ah, aquele time
fez o Olímpico brilhar de forma diferente aos meus olhos. Naquele
ano eu aprendi a força do nosso estádio. Dentro do Olímpico quem
manda é o Grêmio. E eu sorria a cada final de jogo.
Eu também estava lá em 2007, quando a esperança de toda uma nação
desmoronou diante do talento de Riquelme. Se por um lado eu nunca vi
melhor time que o de 1995 desfilar pelos gramados do Monumental, de
outro lado não vi torcida mais apaixonante e empolgada que a nossa
em 2007. Foi um ano de imortalidade, com vitórias sofridas embaladas
no grito. Minha voz nunca mais foi a mesma. Ir ao estádio
significava, como diz meu primo mais velho, “empurrar o fuca”.
Mas naquela partida não foi suficiente. E chorei.
Lembro-me do meu primeiro Grenal. No Olímpico, evidentemente.
Eram outros tempos. Metade do estádio para cada torcida. Era
estranho – e hoje parece até aviltante – que metade no Olímpico
ficasse manchado com o vermelho da torcida adversária. Mas era
assim. Confrontos? Apenas no grito. As torcidas entravam por portões
que de tão próximos faziam com que as massas azul e vermelha se
empurrassem de lado a lado.
Eu tinha 13 anos em meu primeiro Grenal. Sem minha mãe saber, eu e
um amigo fugimos no domingo de sol – sempre é domingo de sol nas
minhas lembranças – para ir assistir ao jogo. Estávamos ansiosos,
e não sabíamos o que esperar. Com certeza, não esperávamos ficar
em um decepcionante empate em um a um. Mas a sensação de estar
naquela partida foi algo que nenhuma outra proporcionaria.
Fui a muitas partidas, ao longo dos anos. Certamente não fui a todos
os jogos que gostaria, mas vivi o Olímpico como se fosse minha
segunda casa. E agora, neste domingo, justamente em um Grenal,
assistirei uma partida do meu Grêmio pela última vez nas
arquibancadas do bom, velho e copeiro Olímpico Monumental.
Não importa o quanto eu sorria, o quanto eu cante, o quanto eu
vibre. Ao final da partida, eu terei os olhos marejados, emocionados.
Pois no concreto do velho estádio, junto com outros cinquenta mil
irmãos tricolores, eu darei um longo e melancólico adeus.
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