Muito importante para todos os que lerem as postagens: por vezes estarei falando sério, postando opiniões próprias. Outras vezes estarei brincando com opiniões que poderiam ser minhas, mas não são. E por vezes postarei material totalmente fictício, frutos da imaginação e talvez um pouco influenciados pelas experiências acumuladas ao longo dos anos.
Distinguir o que é realidade e o que é ficção fica a cargo de cada um.

sábado, 3 de outubro de 2009

Carazinho

Existem lugares que marcam a memória. Na verdade, o correto seria dizer que há lugares que marcam os corações, pois as lembranças que ficam normalmente vem carregadas de sentimentos. Invariavelmente, a maioria de tais lugares “especiais” está presente na infância de cada um, o que explica a nostalgia que sentimos ao buscar na memória as lembranças que lhe são associadas.

Para mim, Carazinho é este lugar. Cidade pequena no interior do estado, foi lá que passei a maior parte do convívio com meus avós maternos. Quando criança, minhas férias de inverno, sem excepção, eram lá. E todos os Natais também. Anualmente, sair de Porto Alegre – pior, sair da Capital – para ir a Carazinho significava dias dentro de casa, sem nenhum programa interessante para fazer, sem amigos, sem videogame. Apenas a constante e agradável companhia do meu vô Aldo, minha vó Artêmia e minha tia-avó Aida. Não à toa foi por lá que adquiri o saudável hábito da leitura.

Com o passar dos anos, as visitas à Carazinho – e digo assim, “visitas a Carazinho” porque para mim ir a Carazinho era o mesmo que visitar o vô e avó – foram minguando. Veio a adolescencia e com ela as mudanças de prioridades nos períodos de férias. Pior ainda quando ingressei na faculdade. As visitas aos velhinhos, que eram fonte de amor e carinho inesgotáveis, passaram a ser eventuais, em escassos fins de semana. Apenas o Natal permanecia firme e forte.

Pensar em Carazinho é um convite a lembrar de cada momento que tive na companhia especial deles. Cada esquina da cidade esconde uma lembrança de algum momento com um dos três velhinhos. Cada lembrança é uma parte do que sou hoje. Foi lá que foi diagnosticada minha miopia e que meu avô me levou para fazer meus primeiros óculos. Foi lá que aprendi a jogar canastra e pontinho. Foi em Carazinho que ganhei de presente minha primeira camiseta do Grêmio. A lista de momentos não tem fim.

Infelizmente, minhas ultimas idas à Carazinho, ainda que repletas de lembranças e sentimentos, foram motivadas pelas mortes de meus avós e minha tia. Até mesmo pela questão profissional, coube a mim responder pelos espólios e resolver os negócios da família.

No último fim de semana retornei a Carazinho. A viagem de ônibus me permitiu terminar a leitura de um romance de John Grisham, “A Casa Pintada”. A história, narrada em primeira pessoa, conta o cotidiano de um garoto de sete anos que vive com seus pais e seus avós em uma fazenda de algodão no sul dos Estados Unidos. A história se passa nos anos 1950 e percebe-se pela narração a nostalgia com que o Autor evoca os momentos descritos no livro. Há, evidentemente, uma forte inspiração em “As Aventuras de Tom Sawyer”, de Mark Twain, mas isso evidentemente é algo positivo.

O que realmente salta aos olhos é o conflito, na mente infantil, entre o sonho de se tornar jogador profissional de beisebol em uma cidade grande e abandonar a vida na fazenda com seus avós e o desejo de permanecer na companhia daqueles que se ama. A cada momento da leitura, não pude deixar de comparar os momentos do protagonista Luke Chandler com seus avós com os meus próprios momentos com meus avós. A impressionante caracterização da vida cotidiana de uma pequena cidade no interior do Arkansas me fez pensar – resguardadas as devidas proporções, evidentemente – nos meus dias de criança quando viajava a Carazinho para ficar na companhia de meus avós.

Ao terminar de ler o livro, estava emocionado. Por certo que a ótima habilidade do autor, autor de “A Firma” e “O Dossiê Pelicano”, entre outros best-sellers, é indiscutível. Mas ao terminar a leitura eu já estava em viagem de volta para Porto Alegre. Dessa vez, fui a Carazinho para assinar a venda do último apartamento que pertencia a família. E foi então que percebi e meus olhos se encheram de lágrimas.

Carazinho nunca mais.

2 comentários:

  1. Acabei de descobrir esse teu blog, surpreendente como nunca comentaste. Entretanto, surpreendente foi ler tua simplória descriçao sobre nossa infância em Carazinho.

    Apesar da nostalgia por aquele tempo, nao posso negar que estou acometida pela tristeza daquilo que senti no dia 02 de novembro de 2007 no velório da Tia Aida: Carazinho nunca mais.

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  2. Que lindo texto ! Os avós,importantes e necessários pra nossa vida ! Fiquei emocionada ao ler, lembrei da minha infância e dos meus avós ! Feliz é aquele que tem boas recordações da sua infância ! Parabéns !

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